quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Intocável.


Intocável. Sempre foi assim. Jamais se permitiu ir tão a fundo em uma relação, independente de qual fosse. Nada a tocava. Cortava qualquer cordão umbilical que colocasse em risco seu coração. Enchia os jardins de erva daninha, antes mesmo de se permitir deixar brotar algo bom. Nada a entristecia. Esbanjava sorrisos mesmo quando os seus olhos - e poucos os decifravam - diziam que estava em perigo, na beira de um abismo, precisando de alguém pra salvá-la.

Quantas vezes intocável? Infinitas. Não dava passos maiores do que a própria perna, por isso nunca soube ao certo qual era a sensação de se pular uma poça d'água. Tinha medo de não conseguir e se molhar. Evitava qualquer tipo de relação que envolvesse muita admiração, paixão, tesão e qualquer tipo de emoção. Ninguém era capaz de ultrapassar os limites e barreiras que ela impunha. Nunca foi forte suficiente pra aceitar o que a vida lhe propunha.

Foi tão intocável. Mas o amor bateu à sua porta. Teve a oportunidade de conhecer tudo aquilo que sempre temeu. Não aproveitou. Teve e perdeu. Em um passe de mágica. Velocidade da luz. Piscar de olhos. Não deu tempo de absorver e simplesmente desapareceu. Tentou ser tocável nessa época. Ela se deixou tocar intimamente quando te conheceu. Sentiu o gosto único da pele. A respiração acelerada. O abraço que não a largava. O coração que palpitava, no mesmo ritmo. Os corações pareciam um só. A certeza na vida de que ali era o seu lugar, que sempre foi o seu lugar. E era. Ela teve tanto medo quando sentiu tudo isso. Recuou. Procurou outras bocas, outros abraços, outros olhos que não os seus. Correu, sem lembrar que caminhar por cima de poças d'águas era mais perigoso do que pulá-las.

Intocável por si só. Não deixava mais ninguém tocá-la. O significado daquele toque - nunca provado antes - jamais se apagou de sua mente. Permaneceu intacto. Intocável como ela. Ninguém poderia apagar nenhuma dessas memórias, nem pudera. Era seu, tudo o que ela guardava. Sempre foi seu o ponto mais intocável do coração dela.

Continuava intocável, à sua espera que nunca voltava, nunca chegava, nunca ligava. À espera do tocável, pra deixar de ser intocável. Mais uma vez. Por vocês, por você e por ela.

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